terça-feira, 25 de janeiro de 2011

So, so you think you can tell?

Era madrugada e estava numa rua famosa da cidade, havia dois amigos meus desmaiados e um outro cuidando deles. Eu me embebedei, terminei com um ou dois maços de cigarro e dei uns tragos em algo estranho que um grupo de amigos alheios me ofereceu. Olhava para rua ainda me sentindo lúcida, um pouco tonta talvez, mas ainda consciente de tudo que me afrontava intimamente. Eu bebia para ele ser o meu gosto, e me embriagava lembrando de seu rosto, seus braços, seus pelos. Um dia ouvi dos lábios de um cantor, que amar é abanar o rabo, lamber e dar a pata. E eu já estava com a fidelidade de um bicho amestrado. De um lado da rua observava a fila gigante que me encarava, a casa de shows estava lotada e eu já havia sonhado com aquele lugar. Tentei, em vão, atravessar os carros que estavam entre a rua. Debaixo dos meus pés trançados o chão ferveu com a borracha do pneu raspando contra o asfalto, o barulho estridente chamou a atenção de todos, e eu estava com a cara colada no vidro da janela. Era o passageiro que cheirava que estava lá dentro, com neve branca espalhada agora por seu jeans importado, narinas estragadas, pertencente a lugar nenhum e me lembrando um pouco de mim mesma, confundindo-se reflexo meu e imagem dele. Estavamos juntos, separados por nós mesmos, confortávelmente anestesiados.

domingo, 9 de janeiro de 2011

Into the wild

Descendo a escada para o quintal fui ficando pequena. Menor e menor a cada degrau, chegando a pairar levemente contra o chão no último. A queda foi parecida como uma pluma que cai de uma ave que voa alto, leve, como leve pluma muito leve, pousei. Observei o jardim das plantas cortadas a minha frente, relva áspera, com sulcos brancos escorrendo de suas entranhas dilasceradas. Tudo parecia maior, a medida de que eu estava menor. O céu visto daquele ângulo reto, rendeu lembranças de um dia chuvoso no qual dancei nua naquele mesmo lugar, debaixo de um temporal de arrastar barracos.
 Cheguei mais perto de toda aquela bagunça, e o cigarro (que não segurava a mais de duas semanas), pareceu me da minha altura. Por curiosidade, adentrei na selva desconhecida de um lugar conhecido, como alguém esquecida. Fiquei emaranhada em algumas teias de aranha cheias de caco de vidro, meu sangue escorreu junto da seiva venenosa. Linhas tênues de formigas andarilhas me levaram ao coração da floresta, lá ele batia forte, vermelho, pulsante, vivo. Via suas veias e artérias, quase que transparentes de pureza, de líquido escarlate por dentro, e delirantemente nítidas a olho nú. Pude sentir a leve tontura de quando se sai do corpo, a sensação de sono provida do verde, a vitalidade de tocar o chão com os pés descalços. Lá, em estado de quase nirvana adormeci de olhos abertos, embalsamada em meus próprios pensamentos, como bolhas preenchidas com formol. Não empalhada por pouco, acordei sem ter que abrir os olhos. Sai do não denominado labirinto sabendo inexplicávelmente o caminho de volta, com risadas nos bolsos e arranhões pelo corpo. Já do lado de fora percebi que, o tempo que tinha passado, tinha sido de apenas um trago.

sábado, 8 de janeiro de 2011

I am the eggman

 Deitei no mar, afundei nas suas águas confortáveis e mornas, com gosto de lágrima. Os pensamentos flutuaram para cima dentro de bolhas, confortávelmente anestesiada, confortávelmente anestesiada. Dormi num sono profundo, sono de sonhos, sonhos de sono, descobrindo o sentido da vida a cada segundo e sem conseguir mover as mãos para a grande descoberta. Manter os olhos fechados era a meta, a faixa amarela de segurança. Nada aconteceria se ninguém percebesse a escapada noturna e os feixes de fumaça nadando no céu de quase-chuva. Me agarrei nos teus cabelos e agora não sei mais como me movimentar para fora desse emaranhado negro e comprido. Dele saem notas, doces e florais, leve toque amadeirado e cítrico. Uma mistura de cores e músicas. Pego me escutando aquela lista já velha e distante, com guitarras distorcidas e gritos entorpecentes. Espero não fazer sentido nenhum nem um , sou apenas o leão marinho na beira da praia.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Flashes

Flash - Você só pode estar ficando louca, ele gritava para ela.
Flash - Você vai nem que seja amarrada.
Flash - Eu não vou.
Flash - Remédios correm por minhas veias me deixando ainda mais trêmula.
Flash - Ela não devia ter parado de tomar aqueles antidepressivos.
Flash - Você está sendo egoísta.
Flash - Escutava meu nome no meio da briga.
Flash - Está louca.
Flash - Sinto o cansaço que envolve os olhos dela.
Flash - Devem ser as drogas. Talvez uma droga de vida, droga de trabalho, droga de cansaço.
Flash - É isso, cansaço, deve ser o cansaço.
Flash - Agora são ruídos, como o da chave girando no trinco da porta.
Flash - Tomara que ela não vá correndo para um lugar qualquer a essa hora da noite.
Flash - Lágrimas ao lado.
Flash - Ainda tento pensar que se chorar, vai ser à toa, pois vai tudo se encaixar.
Flash - Queria, e como queria, encaixar no escuro do coração dele.
Flash - Voz anasalada, por causa do nariz entupido, me corta o coração.
Flash - E pensar que algo me fez querer sair dessa cidade.
Flash -  Merda de vírus da gripe.
Flash - Se eu conseguir roubar um cigarro, vai ocorrer um suicídio dentro de mim.
Flash - Só quero ficar aqui sentada, no silêncio das 500 melhores músicas que estou baixando.
Flash - Que vontade de escutar Chuck Berry, o sobrenome do rock'n'roll.
Flash - Porque ela chora tanto?
Flash - Pelo mesmo motivo que eu, com alguns anos a menos de experiência.
Flash - Seria melhor se a luz do outro quarto estivesse apagada.
Flash - Pelo menos eu sempre soube que esse não era o esteriótipo de família feliz.
Flash - A gente é feliz. Quando dá.
Flash - Tudo bem... Boa noite pra você.
Flash - Porque aqui a noite vai ser longa.
Flash - Aonde foi mesmo que guardei aqueles remédios pra dormir?
Flash - Por incrível que pareça, aquelas poucas palavras que não sabem de nada estão me fazendo bem.
Flash - É uma pena não poder fotografar as estrelas.
Flash - Elas nem mesmo estão lá hoje, que cabeça a minha.
Flash - Ainda giro um pouco.
Flash - Que droga a minha filmadora ter quebrado, agora só me restou a câmera.
Flash - In the flesh.
Flesh - Into the flesh.